sábado, 26 de fevereiro de 2011

APRENDI, ENFIM, A COLOCAR VÍDEOS DO YOU TUBE AQUI... ANALFABYTE !!!

Compartilho com vocês um vídeo narrado em castellano, de fragmentos de Galeano. Traduzi porcamente...




Do ponto de vista do nativo o pitoresco é o turista.
Do ponto de vista do turista a chuva é sua grande maldição e para o camponês é uma boa noticia.
Do ponto de vista do sul o verão do norte é o inverno.
Onde os hindus vêem uma vaca sagrada, outros, contudo, vêem um grande hambúrguer.

Do ponto dos vizinhos do povoado de Cardona, Toto Zaugg, que andava com a mesma roupa no verão e no inverno era um homem admirável.
- Toto nunca tem frio, diziam.
Ele não dizia nada.
Frio ele tinha, o que não tinha era abrigo.

Do ponto de vista das estatísticas, se uma pessoa recebe 1000 dólares e outra não recebe nada, cada uma dessas pessoas aparece recebendo 500 dólares na conta da renda per capita.
Do ponto de vista da luta contra a inflação, as medidas de ajuste são um bom remédio, mas do ponto de vista de quem as padece, as medidas de ajuste multiplicam a cólera, o tifo, a tuberculoses e outras moléstias.
Do ponto de vista do oriente o dia do ocidente é noite e na índia guardam luto vestindo de branco.
Na Europa antiga o negro, cor da terra fecunda, era a cor da vida. E o branco, cor dos ossos, era a cor da morte.
Segundo os antigos sábios da região colombiana de Chacó, Adão e Eva eram negros e, portanto, negros eram seus filhos. Quando Caim matou Abel com uma pancada, trovejaram as iras de Deus. Ante a fúria do Senhor o assassino se empalideceu de culpa e medo e tanto empalideceu que branco ficou até o fim de seus dias. Nós, brancos, somos todos filhos de Caim.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Da Política das Pulgas (e dos investimentos no Protocolo de Manchester)



Trabalhar como médico em uma Unidade de Saúde não é tarefa fácil. Tudo se torna ainda mais difícil quando este médico procura conhecer o funcionamento dessa imensa rede “descentralizada”.
Recentemente estava em meu posto de saúde quando fui surpreendido com a chegada de um computador modernóide, equipado com um medidor de saturação de oxigênio e um termômetro auricular (como consta na foto acima)! Um técnico prontamente instalava em um bairro miserável de uma região mineradora/metalúrgica tão rica o que seria, segundo a Secretaria Estadual de Saúde, os meios para aplicação de um protocolo que “facilitará a estruturação da rede e o encaminhamento do usuário. A nossa meta é que todo o atendimento realizado seja baseado na necessidade real do usuário, e não mais na ordem de chegada”.

Ante ao que aconteceu, à minha surpresa, resolvi dialogizar mais a respeito do tão curioso fato, e compartilho com vocês.

O PSF, programa iniciado no então governo FHC pelo ministro Henrique Santilho, no ano de 1994 é uma estratégia que ainda não se estabeleceu por questões primárias, relacionadas mesmo à política macro que em nada se orienta para a socialização plena do acesso à saúde (Universalidade, um dos três princípios doutrinários do SUS). Nunca se investiu tanto na atenção secundária e terciária à saúde quanto nos tempos de hoje. Isto em tempos que o PSF ainda nem dispõe de capital humano para seu funcionamento pleno.

A academia, inundada de interesses escusos, teima em formar médicos “despreparados” com a sugestão implícita que sua formação se concluirá na “especialização”. Os professores cada vez mais especializados depositam nos seus tutelados o conhecimento fragmentado da medicina segmentar, tão consagrada em nossos livros de estudar pescoço, outros de estudar rins, fígados, e por aí vai.

A proposta de adequação curricular iniciada na década passada trouxe mudanças modestas nas grades (com trocadilhos, prisões) curriculares de muitas faculdades, cada vez menos abertas à livre iniciativa da criatividade do aluno, verdadeiros centros de formação de técnicos para operarem os equipamentos ultra tecnológicos que a indústria de insumos joga aos montes no mercado (que é a mesma que vende medicamentos, que é a mesma que investe em pesquisas na cura de doenças).

Além das modificações modestas das Grades Curriculares em muitos casos pudemos presenciar o que muitos chamaram de “Inserção Precoce” dos alunos aos sistema de saúde. O que, em termos gerais soa muito bonito, mas na prática resultou em Inserção Precoce à Doença. Pensam os diretores de ensino de diversas faculdades que colocar um estudante em contato com um tuberculoso logo no seu primeiro ano de estudo trará precocidade à sua capacidade de entender o funcionamento do serviço. Sem entender o processo histórico-social-político-cultural que proporciona a apresentação deste moribundo à sua frente este pobre calouro não trará muitos benefícios a outros tuberculosos quando em seis anos já estiver clinicando. Tratará “a doença com o medicamento”, sem saber que diversos outros remédios para este mal se encontram fora das drogarias (hoje em dia, verdadeiros shoppings). É mais ou menos como foi feito em uma tradicional escola particular de medicina de Belo Horizonte: no mesmo ano que tiraram a disciplina de História da prova do vestibular implantaram no currículo médico a disciplina “História da Medicina”.

Essas insanidades todas nos fazem acreditar cada vez menos na capacidade geradora de recursos humanos para aplicabilidade da Política Nacional de Atenção Básica. Não que eu queira sugerir, ao justificar as deficiências da formação médica, que a figura do médico é a responsável pelo sucesso desta política. Mas poderia, sem sombra de dúvidas, afirmar o contrário: que a figura do médico é responsável direta pelo insucesso atual desta política!

Fala-se muito na dificuldade em conseguir profissionais médicos para trabalhar nas unidades básicas de saúde, porém eu nunca vi alguém questionar na dificuldade de se captar médicos CAPACITADOS para tocarem tão importante Programa. A moda é, na falta de escolha, empregar médicos recém formados para trabalho temporário, que durará até a sua aprovação na residência médica (nome eufemístico para vestibular de “doutores”). O grande problema é que os resultados dessa efêmera passagem pela Unidade de Saúde não são temporários. Estes médicos despreparados prestam verdadeiro desserviço à população local, ao relacionamento interno da equipe e à cultura da boa prática clínica. Esses colegas, centralizadores – com a conivência dos gestores que não conseguem outro para o seu lugar – monopolizam o trabalho da equipe na figura de sua pessoa, com suas singularidades muitas vezes nada atrativas. É muito comum ver pacientes dizerem que não se consultarão no posto “x” porque lá o médico é “muito ignorante”. Ora, e o restante da equipe? Enfermeira, técnicos, dentista, agentes de saúde... Estes todos também o são?

A lógica do funcionamento da saúde é centrada na figura do médico. O PSF reverbera isto. Trouxemos para o trabalho descentralizado da atenção básica – que busca medidas de prevenção com práticas de educação em saúde – a figura do médico secundarista! Este médico, apesar de trabalhar num programa que tem suas raízes em preceitos contra-hegemônicos, graduou-se na mais pura escola médica doença-centrada. Não aprendeu de forma prática o funcionamento de seu Sistema de Saúde, pois foi rapidamente seduzido pelo mágico poder da cura (e esta, claro, pressupõe a doença). A este estudante não fora apresentado Paulo Freire, pois o tempo lhe era escasso na rotina degradante de decorebas e algoritmos. Sem conhecer Freire este médico trabalhará no PSF sem entender que “para intervir numa realidade é necessário conhecê-la”. Estes egressos trabalharão num cargo que é tanto pedagógico quanto técnico, mas não têm linha pedagógica alguma a seguir! E no entanto, a equipe de saúde, apesar de maioria em número, paradoxalmente deve acolher este doutor que definirá a práxis da equipe, mesmo sem prática alguma.

O PSF vai sendo tocado pra frente! Entra médico e sai médico, “tudo continua como dantes no quartel de Abrantes”. Exceto com os novos computadores que chegaram. Vamos aos computadores...

Minas Gerais é o primeiro estado brasileiro a implantar, na atenção básica, o Protocolo de Manchester. Trata-se de uma nova estruturação dos serviços de urgência e emergência capaz de otimizar a gestão do fluxo de pacientes e, além de tudo, permitir que esse mecanismo seja auditado. Este protocolo foi aplicado em modelo vanguardista no Hospital de Pronto Socorro João XXIII e posteriormente em outros instituições do Belo Horizonte.

Bom, mas aí vem a pergunta: Por que implantar na atenção básica um modelo que foi criado para a urgência e emergência? Ouso dizer que se o paciente grave chegou a um Posto de Saúde ele já está no local errado para seu atendimento!

À unidade básica de saúde cabem os casos de atenção primária, prevenção e promoção de saúde. Qual o interesse em protocolizar o meu afluxo de pacientes numa lógica criada para o paciente que necessita de atendimento emergencial?

A lógica, meus amigos, é a mesma que rege nossas vidas como um Grande Irmão (falo do livro de George Orwell). É a lógica que joga às mãos dos incapazes de receber com afeto seus pacientes no posto de saúde um computador frio que, em formato de extrato de banco, lhe dirá qual é o tempo que sua doença pode esperar.

Na Resolução 2334 da SES, de junho de 2010, que “define o valor do incentivo financeiro por município da Implantação do Protocolo de Classificação de Risco em Urgência e Emergência – Sistema Manchester”, é mostrado que o estado de Minas gastou R$ 25.856.278,70 para a aquisição dos kits contendo aparelho de computador, oxímetro, e termômetro auricular, a serem instalados em 3065 unidades de saúde (um custo de R$ 8.432,98 por kit!!!). Numa matéria do blog “Fax Sindical” é revelado que o estado de Minas gastou 48 milhões de reais com a aquisição do software da empresa ALERT. As negociações a cerca deste programa foram iniciadas e seladas entre 2007 e 2008 e, de acordo com o que fora combinado entre estado e fornecedora, havia a necessidade de aplicação do programa (no mesmo mandato, pressuponho). A forma de resolver tal impasse é facilmente entendida num documento de março de 2010, onde a Secretaria Estadual de Saúde, através da Superintendência de Gestão, na figura da Gerência da Tecnologia da Informação publica um “Termo de Referência”, subtitulado:


REGISTRO DE PREÇOS PARA FORNECIMENTO, DISTRIBUIÇÃO E INSTALAÇÃO DE ATÉ 4.000 UNIDADES DE TRIAGEM PARA A CLASSIFICAÇÃO DE RISCO CLÍNICO DE PACIENTES NOS TERMOS DO PROTOCOLO DE MANCHESTER.

Neste documento lê-se:

“Desde janeiro do ano de 2008, após a aquisição das licenças do sistema de classificação de risco denominado ALERT Manchester pela SES/MG, a Coordenação Estadual de urgência e Emergência vem buscando soluções para a aquisição, distribuição, instalação e homologação dos equipamentos necessários para a operação do sistema de informação e coleta dos parâmetros clínicos, necessários para a classificação de risco clínico dos pacientes, segundo as diretrizes do Protocolo de Manchester.
Nesse sentido, a Coordenação de Urgência e Emergência iniciou vários processos de compra dos itens acima referidos, esperando com isso solucionar o problema de equipamentos e partir para a implantação do sistema de classificação de risco, nos 4.000 pontos, de atenção à saúde, previstos no Projeto da Rede de Urgência e Emergência, bem como no contrato firmado com a empresa ALERT.”


Fizemos o caminho inverso! Que se comprem equipamentos para implantar o software já adquirido. Mas e a necessidade do software, quando foi discutida? Se a justificativa é “reduzir o tempo de espera” devo salientar que isso passa muito mais por uma política local de acolhimento que pela aquisição de máquinas!

Com ele, a atenção estará focalizada nos casos que exigem atendimento mais rápido e não mais na ordem de chegada do paciente.” Ora, e quem disse que a ordem de chegada deve ser determinante da prioridade no atendimento? Em minha Unidade implantamos outro modelo, um pouco menos tecnológico, chamado AGENDA DE PAPEL, que me permite gerenciar minhas vagas e, durante o dia-a-dia, reservar tempo para o atendimento dos casos agudos.

Há uns anos o Ministério da Saúde lançou a Política Nacional de Humanização na saúde (prova cabal de que nos reconhecemos animais a serem humanizados). Dentro desta política havia uma cartilha para melhoria das práticas de acolhimento. Lá está escrito o que todo profissional da saúde deveria saber desde sempre, que o “acolhimento não é um lugar, ou uma sala, é uma conduta”. O tempo de espera, bem como a forma e a condição que este paciente deverá esperar, é trabalhado pela equipe sob a égide de preceitos éticos e de acordo com a capacidade de operacionalização do serviço local. Um computador, no meu posto que no ano de 2011 ainda não conta com internet, é um objeto desnecessário! Num posto onde não tenho carro para fazer visitas domiciliares um oxímetro é perfeitamente dispensável. Onde não há disponibilidade de D.I.U. (dispositivo intra-uterino) e freqüentemente falta captopril (medicamento básico para o tratamento de Hipertensão Arterial) não é necessário um termômetro auricular! Num estado desigual como o nosso 73 milhões de reais jogados fora com aparato tecnológico soam como deboche aos moradores de um bairro que não tem nem mesmo local para se fazer caminhadas. Um bairro que não tem praças, que convive com esgoto a céu aberto, onde falta água potável e sobram bares e bocas de fumo!

Esta realidade também traduz a lógica do Grande Irmão, nosso provedor. Há que se haver pobreza para se gastar com ela! Eduardo Galeano diz que “o Estado neoliberal é como uma stripper que não tira a calcinha” Assim o Estado foi historicamente se despindo de suas responsabilidades, jogou à platéia os serviços básicos, o direito à exploração da terra e à expropriação dos que dela necessitam, mas manteve consigo, como única peça, o dever de assumir que tudo isto aconteça com ordem, sob poder de polícia, com aparato legal montado. Este Grande Irmão investe no que é necessário para poucos em nome do desmazelo irônico dispensado à grande massa.

Agora poderei dizer aos meus pacientes analfabetos que “segundo o protocolo de Manchester a senhora deve aguardar 2 horas”! Grande evolução na minha relação com meus pacientes...

Para finalizar o que já está longo demais, lembro aqui de uma historinha que ilustra muito bem o que eu não conseguiria explicar sucintamente:


Diz a estória que um médico muito antigo se aposentara e em seu lugar o próprio filho, recém formado em medicina, assumira consultório particular, único local de atendimento médico de toda a região. Ao iniciar seus trabalhos o jovem médico recebeu a visita de vários pacientes que sofriam de coceira crônica, uns na nuca, outros na virilha...
Conversando com os pacientes os mesmo referiam que há anos – e alguns há décadas – tratavam com seu pai que lhes receitara pomadas, comprimidos, xaropes e outros medicamentos que surtiam efeito passageiro.
Ao examinar melhor um paciente descobriu uma pulga em sua nuca e, ao retirá-la constatou que o mesmo parou de coçar, solucionando assim, definitivamente, seu problema. O mesmo ocorreu com vários e vários outros pacientes. O médico, feliz com a sua descoberta clínica foi prontamente à capital onde seu pai morava em confortáveis leitos para dar-lhe a boa nova. Ao contar para o pai foi duramente reprimido pelo velho que o disse:
- Você arruinou sua carreira! Graças a estas pulgas pude pagar sua faculdade!


Esta é a política de saúde do nosso Big Brother: a política das Pulgas!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Uns caras desses nunca vão embora!

Grande Mark...
poeta é aquele que fala o que outros são capazes de sentir... perfeitamente.

Abaixo  uma música desse nosso amigo que "ficou encantado" há alguns anos.

CLICK AQUI PARA VER ....

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Desânimo
“Na parede de um botequim de Madri, um cartaz avisa:
Proibido cantar.
Na parede do aeroporto do Rio de Janeiro, um aviso informa:
É proibido brincar com os carrinhos porta-bagagem.
Ou seja: Ainda existe gente que canta, ainda existe gente que brinca.”
Eduardo Galeano

Pensamos coisas já pensadas, agimos como esperado, cumprimos o que é devido.
Sonhamos somente o possível, imaginamos o concreto.
Brincamos até os 12. Também é até essa idade que podemos chorar.
Não temos tempo; sobram protocolos, falta coragem. O sonho é Vinícius, a práxis Lair Ribeiro, o modus “Cidadão Comum”.
Rimos pouco, trabalhamos muito, ganhamos mais que o suficiente (mas ainda é pouco).
Não pode beijo em amigo; em namorada, com entusiasmo, só no primeiro ano. Depois, novo protocolo!
Amamos baixinho – gritar não pode! Ofendemos o vizinho – mesmo quando não o conhecemos.
Dançamos miudinho, com jeitinho (jeito sem jeito) pra não escorregar. Machucamos muito, machucamo-nos pouco...
Não há mais “galos, noites e quintais”. “Não há mais festa, nem carnaval”. Bolero...
Somos seres de alma cansada, corpo exausto. Nascemos semimortos, aguardamos o recolhimento.
Nós já éramos!
Tiago Jeremias


terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Poesia que tentei fazer...

Poesia abortada

Conto um conto ao ponto que me fez parar.
A poesia iniciou pelo fim
E já não tenho mais como começar.
... ... ...

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

MÚSICA!!!!!


Esse grupo chama-se "5 a seco". Galera novinha fazendo um sonzaço com letras muito trabalhadas...
Um deles é filho da Teté Espíndola e tem outro que é filho do Celso Viáfora (alguém aí lembra da "Cara do Brasil"? Uma música massa demais... pra quem não lembra, coloco link e letra abaixo também.)
Os caras nem lançaram CD e tão fazendo uma porrada de shows legais.

Segue a letra sensacional de "Impasse" com o link deles locando na rua.

ps: Precatinho, lembrei de você demais. Sei que curte música boa, vais curtir isso..



"Impasse" - 5 a Seco. Música de Vinícius Calderoni (click no nome para ouvir e ver...)

Inconciliáveis
Nesse amor de rotações incontornáveis
Fomos dois cortando os dedos na colheita
Somos dois que não merecem solidão

Inacreditáveis
Mesmo dias ocos de humores instáveis
Logo vinham peripécias, malabares
Somos nem sombra difusa de um verão

Que o nó que emperra e barra a vida à vera
É o mesmo que nos ata um ao outro em comunhão
Que surge a indecisão que dilacera
E ela regenera a esperança sem razão
Que fica um tal de só dizer "quem dera"
E o desenlace desse impasse
Está além de onde a vista alcança
Só resta dizer:

Fique firme tenha fé
Mesmo que em nada dê
Tudo ainda está de pé
Tudo está para nascer

Fique forte, firme o pé
Tudo dá n'algum lugar
Mesmo se o olho não vê
Tudo ainda vai brotar

Só resta dizer:

E o desenlace desse impasse
Deus conceda que termine em valsa
Só resta dizer...


E como prometido lá em cima...



"A Cara do Brasil" - Celso Viáfora (click no nome da música para ouvir e ver...)

Eu estava esparramado na rede
jeca urbanóide de papo pro ar
me bateu a pergunta, meio à esmo:
na verdade, o Brasil o que será?
O Brasil é o homem que tem sede
ou quem vive da seca do sertão?
Ou será que o Brasil dos dois é o mesmo
o que vai é o que vem na contra-mão?
O Brasil é um caboclo sem dinheiro
procurando o doutor nalgum lugar
ou será o professor Darcy Ribeiro
que fugiu do hospital pra se tratar

A gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho
Ninguém precisa consertar
Se não der certo a gente se virar sozinho
decerto então nunca vai dar

O Brasil é o que tem talher de prata
ou aquele que só come com a mão?
Ou será que o Brasil é o que não come
o Brasil gordo na contradição?
O Brasil que bate tambor de lata
ou que bate carteira na estação?
O Brasil é o lixo que consome
ou tem nele o maná da criação?
Brasil Mauro Silva, Dunga e Zinho
que é o Brasil zero a zero e campeão
ou o Brasil que parou pelo caminho:
Zico, Sócrates, Júnior e Falcão

A gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho...

O Brasil é uma foto do Betinho
ou um vídeo da Favela Naval?
São os Trens da Alegria de Brasília
ou os trens de subúrbio da Central?
Brasil-globo de Roberto Marinho?
Brasil-bairro: Carlinhos-Candeal?
Quem vê, do Vidigal, o mar e as ilhas
ou quem das ilhas vê o Vidigal?
O Brasil encharcado, palafita?
Seco açude sangrado, chapadão?
Ou será que é uma Avenida Paulista?
Qual a cara da cara da nação?

A gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho ...

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Microcontos de Baião

Permito-me compartilhar com vocês 3 "microcontos" que achei no Blog de um amigo...

Baião, saudades, meu velho!

Seguem...

3 microcontos - André Baião.
Semáforo
 No semáforo, ontem, a velha batia uma vida no vidro fumê de um carro cinza. O pano que enrolava seu rosto não lhe dava espaço o suficiente para abrir bem a boca. Ainda assim, tentava articular seu repetido mantra de pedir esmolas. Alguém, dentro do carro, arrancava do tapete uma moeda, caída ali há semanas. O vidro se abaixou, a moeda caiu calma nas mãos negras e enrugadas da velha. Ela o abençoou. Segurou como se fosse de ouro. O sinal abre. Os carros se revezam dentro da cidade. A cidade passa. A velha já é outra, hoje.
 .....................................................................................................................Asas
Da cama vermelha, a prostituta olhava o espelho. Permanentemente embaçado, jogava uma mancha furta-cor na imagem. Toda vez que se via, ensaiava um sorriso. Saía triste, mas lembrava que poderia ser aeromoça. Sabia sorrir como as aeromoças, ela pensava. Queria passar o maior tempo possível de sua vida sem pisar na Terra. Queria ter asas ao menos no nome : Aero - moça . Das asas que tinha quando criança, esta era a única que não se cortara.
......................................................................................................................No velório
O menino não estava triste no velório. Achava, no fundo, curioso o modo como as pessoas grandes choravam. Às vezes, se brotava vontade de rir, segurava. As muitas cores nas flores atraíram seu foco. Viu uma abelhinha preta que brigava com outra no miolo de um crisântemo. Experimentou o verniz vermelho do caixão com a mão. Era liso que só! Nenhuma farpa. Uma mão posta em sua cabeça, uma voz que dizia coisas que não entendia, soluçava. Tinha medo de ser repreendido por não estar chorando, então começou também.

Charge do fim de semana...

Extraída do sítio "Brasil de Fato"

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A fome (2)

Meu Deus... essa foto geme!

Sebastião Salgado



A cara da fome é o que há de mais violento! Assusta, tira meu sono. Me faz covarde e cruel na glutonia diária. Me faz infeliz degustador de sabores excludentes.
A fome, meus caros, míngua músculos e almas. É a tragédia humana em seu clímax. A fome é a vergonha compartilhada.
Quem nunca passou fome que se dane. Que eu me dane. Que esse mundo horrível se dane em nome de um outro mundo possível. Onde um prato de comida nunca seja fim!

A fome é a violência. Crua, sangrando. O homem com fome, animal instintivo, tem o direito à violência plena como vocalização de sua indignação (indigna ação). O homem com fome fala com os punhos, berra pelos dentes e grita pela foice!

O homem com fome nem homem é. Não há moral nessa condição desmoralizante. Ética... que se dane a ética nesse mundo aético! A fome manda ao inferno as religiões. A fome só quer deixar de ser fome. Nada mais.

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Cito abaixo o grande Josué de Castro. O único homem no mundo que morreu de saudades... Iluminado, e triste com a nossa fome geográfica (recomendo a todo brasileiro ler Geografia da Fome, antes de se dizer brasileiro).

"Mas não é agindo apenas sobre o corpo dos indivíduos, degradando-lhes o tamanho, mirrando-lhes as carnes, roendo-lhes as vísceras e abrindo-lhes chagas e buracos na pele, que a fome aniquila o homem. É também atuando sobre seu espírito, sobre sua estrutura mental, sobre sua conduta social.
No estudo da influência da fome sobre o comportamento humano devemos considerar, em separado, a eventualidade da fome aguda das épocas de calamidades e a da fome crônica, latente ou específica.
Nenhuma calamidade é capaz de desagregar, tão profundamente e num sentido tão nocivo, a personalidade humana como a fome, quando atinge os limites da verdadeira inanição. Fustigado pela necessidade imperiosa de comer,o homem esfomeado pode exibir a mais desconcertante conduta mental. Seu comportamento transforma-se como o de qualquer outro animal submetido aos efeitos torturantes da fome(...)."


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