segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Sussuruídos

A gente vai percebendo que envelhecer é um processo mais complexo que a simples cronologia da coisa. Também se vai criando o sentimento de que não é só o corpo que adquire rugas e cicatrizes. A alma, esse fantasma que ainda não voou, também guarda suas cicatrizes, ganha rugas, perde os cabelos.
Uma vez ouvi que envelhecer é acumular perdas. Por isso é que algumas crianças órfãs são estranhamente maduras, como velhos em pele tenra. O fim de um amor; um adeus dito entre dentes; a morte de um amigo...  São infortúnios que nos tornam amargos, pesados, inexoravelmente velhos!

Ao meu amigo que ficou encantado ontem, ofereço-lhe uma Rosa:


"Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio."

(trecho de "A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa)






quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Pequeno Conto Andarilho


Pequeno Conto Andarilho

O dia, que mais pareceu um ano, acabou dolorido. As costas sobre o chão duro, tão frio quanto úmido, tremiam com o viaduto.  Queria comer, dormir, sonhar, conversar... Queria um monte! Mas querer passa... Dizia a si mesmo, em pensamento, como um monge paciente.

E a noite trouxe gentes que voltavam pra casa. E eram gentes bastantes! Um passante, dentre quase mil, jogou-lhe uma moeda certeiramente à mão, preguiçosamente estendida e, ironicamente, despretensiosa. Apertou-a entre os dedos. Apertou muito! Ainda estava quentinha... Perdeu, naquele momento, a fome e o frio. Ficou farto e feliz! Repleto de energia! Ganhara, naquele dia, mais calor que no ano todo!

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Amar...

Interpretações que me danam todo... Amar! Esse verbo...
Barroco!











quarta-feira, 24 de julho de 2013

Barão de Cocais construirá posto de saúde de mais de R$ 1.000.000,00

Novo Posto de Saúde do bairro Leão XIII/São Miguel vai custar mais de um milhão de reais!!!

Essa foi a notícia que o atual prefeito (na berlinda por um processo de cassação) veiculou com orgulho na última semana.
Durante os dois anos que trabalhei no referido bairro, a última coisa que passou pela minha cabeça foi “investir” em uma nova construção.
Prefeitos e secretários de saúde tendem, por serem leigos, a direcionar dinheiro às coisas menos importantes! Acho isso incrível! Esses senhores não entendem que não é de blindex que a saúde precisa!

Nos felizes anos que lá trabalhei desenvolvemos (eu, a maravilhosa enfermeira Luciene, as técnicas em enfermagem Cida e Gracinha, a odontóloga Regina, a nossa (faz tudo) faxineira Andréia e as 5 agentes comunitárias de saúde) um trabalho que, em momento algum, foi prejudicado pela estrutura física do local.
Pelo contrário... Tínhamos uma linda Farmácia Verde (com mais de 60 plantas medicinais plantadas por nós e pelos próprios pacientes) e um lindo jardim com duas jabuticabeiras que serviam a molecada à época certa. Tínhamos um bom espaço para reuniões e consultórios razoáveis. Faltava, de fato, uma “meia sola” na cozinha...
Isso porque sei que muito mais importante que estrutura física é a estrutura humana! E ainda muito mais importante que estrutura física é a estrutura organizacional. Estrutura esta que Barão de Cocais nunca teve!
A Secretaria de Saúde é desorganizada. As secretarias não conversam entre si. As referências clínicas não contra-referenciam. O Hospital Municipal encontra-se em outro mundo que não aceita dialogar com as Unidades Básicas de Saúde. Não há dados confiáveis (epidemiológicos) para planejamentos na saúde. Não há um modelo, uma linha central ideológica a ser seguida... Gestores, geridos e pacientes (vítimas) são cegos num tiroteio em que, vez por outra, alguém morre mesmo.

Em nosso posto, mesmo sem grandes ajudas da prefeitura, trabalhamos conceitos como o PODER LOCAL ao criarmos o Conselho Local de Saúde. Fizemos uma verdadeira mobilização, com candidatos, eleitores e uma grande vitória do controle social tão falado, mas pouco aplicado no SUS. Tínhamos um Coral que se chamava “Eu toco a vida com música”... Não existia a prática de “pegar ficha”. Ninguém ia para casa sem atendimento, caso necessitasse.

Fazíamos todos os pré-natais e todas as cirurgias ambulatoriais necessárias. Às vezes fazíamos até mesmo suturas – uma forma de aliviar o Hospital. Tínhamos dias de visitas com agenda pré-determinada. Iniciamos a classificação de risco familiar com aparato teórico (Escala de Coelho) bem justificado. Tínhamos reuniões de equipe toda semana, em roda, para cobranças, planejamentos e discussões quanto às nossas práticas (uma forma de “educação permanente” que se opunha à “educação continuada” proposta pelos PEPs do senhor Aécio Neves, tão superficial e ineficiente).

Negamos os computadores obsoletos distribuídos para classificação de Manchester na UBS (ideia insana do Governo do Estado) por acreditarmos que ACOLHIMENTO é um dos grandes pilares da atenção básica! A relação equipe/paciente era muito harmônica. Fazíamos busca ativa dos casos necessários. Dialogávamos com a APAE, com a Cadeia Pública municipal, com a diretoria da escola do bairro, com as igrejas... Fazíamos grupos operativos com fins específicos, inclusive grupos à noite (para facilitar a participação dos trabalhadores, tão ocupados durante o dia).

Todas essas coisas, as quais eu acredito, não custaram dinheiro. Custaram tutano e tempo! Tempo ‘gasto’ com prazer e amor na luta por uma saúde acolhedora!

Proponho ao senhor prefeito se capacitar mais. Ao senhor secretário de saúde proponho passear pelo bairro. Verá que não há local para esportes e caminhadas. Não há meios de lazer que não botecos e ‘bocas’. Não há espaços culturais. O rio que cruza o bairro é imundo. Os índices de alcoolismo, violência contra a mulher, prostituição, estão entre os maiores da cidade. É um bairro esquecido!
NADA DISSO VAI SER RESOLVIDO COM UM NOVO PRÉDIO!


Um milhão de reais daria, inclusive, para treinar melhor sua equipe para, quem sabe, em um futuro próximo, não cair novamente no erro que vocês estão caindo!

Seguem abaixo fotos ilustrativas (e saudosas, pelo menos pra mim).

 Coral "Eu toco a vida com música"


 Eleição para o Conselho Local de Saúde


Regina (odontóloga) em nosso lindo pátio interno, em Grupo Operativo 


Discussão sobre o Estatuto do Conselho Local de Saúde, já com os eleitos.


Farmácia Viva (nos fundos do Posto)

Lanche servido no Grupo de Hipertensão e Diabetes (feito por nós mesmos, com decoração de folhas retirada na própria Farmácia Viva)





quinta-feira, 6 de junho de 2013


Uma das eróticas de Drummond...




A castidade com que abria as coxas

A castidade com que abria as coxas

e reluzia a sua flora brava.
Na mansuetude das ovelhas mochas,
e tão estreita, como se alargava.


Ah, coito, coito, morte de tão vida,

sepultura na grama, sem dizeres.
Em minha ardente substância esvaída,
eu não era ninguém e era mil seres


em mim ressuscitados. Era Adão,

primeiro gesto nu ante a primeira
negritude de corpo feminino.


Roupa e tempo jaziam pelo chão.

E nem restava mais o mundo, à beira
dessa moita orvalhada, nem destino.


quinta-feira, 9 de maio de 2013

Aos meus amigos sonhadores... para não perdermos a vontade da vontade!

Precato, Trololó, Pomba, Manuel, Geraldo, Beto(es), Vinícius, Delán,  Bruno, Franqueza, Lincoln...

una canción!




 



*

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Thiago de Mello

Chará - mas quem me dera ser grande como!
Pra quem não conhece:





Um trecho de "Recado de Companheiro"


"...tens de guardar
dia a dia, mesmo doendo,
o amor no teu coração:
sabendo que amor só cresce
quando se reparte inteiro
e se deixa de crescer
de ser amor também deixa…"





...e outro que só entende quem entende:

PARA OS QUE VIRÃO

Como sei pouco, e sou pouco,
faço o pouco que me cabe
me dando inteiro.
Sabendo que não vou ver
o homem que quero ser.


Já sofri o suficiente
para não enganar a ninguém:
principalmente aos que sofrem
na própria vida, a garra
da opressão, e nem sabem.


Não tenho o sol escondido
no meu bolso de palavras.
Sou simplesmente um homem
para quem já a primeira
e desolada pessoa
do singular – foi deixando,
devagar, sofridamente
de ser, para transformar-se
- muito mais sofridamente -
na primeira e profunda pessoa
do plural.


Não importa que doa: é tempo
de avançar de mão dada
com quem vai no mesmo rumo,
mesmo que longe ainda esteja
de aprender a conjugar
o verbo amar.


É tempo sobretudo
de deixar de ser apenas
a solitária vanguarda
de nós mesmos.
Se trata de ir ao encontro.
( Dura no peito, arde a límpida
verdade dos nossos erros. )
Se trata de abrir o rumo.


Os que virão, serão povo,
e saber serão, lutando.




quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O amor...


E não é o amor uma coisa estranha?
Sente-se-lhe mesmo quando não se ama.
C. Altas, 17/01/2013