quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Aniversário

Essa é uma poesia do já citado abaixo Álvaro de Campos, também conhecido como Fernando Pessoa. Um presente que ganhei nesse "cumpleaños feliz".

A todos os amigos, aproveito para deixar sonhos em sol maior para o próximo ano.

 
Aniversário
Álvaro de Campos

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a.olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos. . .
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

3 comentários:

  1. Vastíssimo mundo! Não falei que ia achar seu blog e comentar? Gostei bastante. De sonhos, utopias e revoltas vive o homem que nunca se satisfaz com o ouro de tolo e a reprodução compulsiva e entediada de tudo que está consolidado. É muito significativo porque a primeira vez que tomei contato com esse sentimento foi quando me transferi para Viçosa em 1.998. E foi por intermédio de pessoas como você e alguns professores que o adquiri. De alguma forma foi a minha aurora para horizontes mais vastos. Aliás, vejo aquele ano de 1998 como a verdadeira aurora de minha vida quando cheguei a Viçosa. Por isso foi muito bom revê-los nas bodas de caná do Renato. Do pouco que li do seu blog, prometendo ler mais, e se não o interpreto mal, só não compartilho mais da utopia revolucionária que é feita da concentração do poder e do morticínio inútil. Mas mesmo abandonando a utopia revolucionária, a utopia do mais, do melhor e da transcendência sempre continua, porque nenhum de nós vai querer o tédio supremo de “dar pipocas aos macacos.” Acho muito bacana que você tenha escolhido também, entre suas especialidades, a de “médico de família”, um médico onde ele realmente mais importa. E fiquei feliz de vê-lo com a mesma vitalidade, força, juventude e lascívia com que o conheci em 1998.”

    Até breve, Vinícius de Oliveira, "o que não falava, do Coluni 1998-2000."

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  2. Pô, Vinícius! Que bom cara! Que bom...

    Gostei do "até breve".

    hehe... e não sei o que dizer da lascívia.

    No mais, bora manter contato. Simbora manter essa chama acesa.

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  3. Ahh, ja ia me esquecendo!
    Precato leu um conto seu... curtiu demais.
    Bora trocar figurinhas aqui no blog?

    valeu
    Jeremias

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