quinta-feira, 7 de abril de 2011

O desvio do PT (extraído do Brasil de Fato)


Às vésperas de definições quanto à entrada ou não no "Jogo Democrático" me incitam algumas coisas que tenho lido, como que por perseguição.

Venho aqui lançar meu manifesto à Constituição da Mandioca que é o nosso processo eleitoral (por alguns imbecis e manipuladores capciosamente chamado "processo democrático"). Se em idos de 1820 os alqueires de mandioca plantados definiam quem votaria, hoje essa lógica se fundamenta na capacidade de angariar fundos em prol de um projeto político classista, construído a partir de ambições de grupos.

Candidatar-se é lançar-se no mercado do voto. "Nesses dias tão estranhos o que é demais nunca é o bastante" quando se trata de dinheiro. Dinheiro compra pessoas, ajeita coligações, facilita negociatas. O dinheiro, seja bruto ou na forma especulativa, é o grande mote que faz com que uns se aliem a outros nesse processo de repartição do grande bolo que é o Brasil e sua gente.

Passados pouco mais de 20 anos da aprovação de nossa Carta Magna podemos dizer que a ditadura está com uma roupagem nova. Poucos continuam mandando, todos obedecem... E não é a "democracia" um ambiente muito mais rentável aos grandes investidores?

"A democracia é quando eu mando em você... a ditadura á quando você manda em mim", já dizia um sociólogo nato. Outro gênio desconhecido dizia que "campanha política é um expediente democrático em que o candidato pede dinheiro ao rico para comprar o voto do pobre e promete a ambos defender um do outro".
Segue o texto...


O desvio do PT




Com o tempo, o PT também resvalou para o exclusivismo eleitoral


Marcelo Mário de Melo



Nada a dizer sobre os partidos de direita e centro-esquerda que sempre foram exclusivamente eleitorais e mantêm o seu perfil. Mas o PT é um caso a se considerar, pois surgiu com uma forte influência dos movimentos sociais e criticando o modo de agir dos demais partidos. Propôs a participação das bases, com a incorporação de milhares e milhares de cidadãos e cidadãs ao processo político. No seu Manifesto  Programa, de 1980, está escrito que a atuação nos meios institucionais não eliminaria a participação nos movimentos sociais e sua mobilização. A inflexão nessas duas vertentes se apresentava como o elemento diferencial e inovador, a cara do PT.

Com o tempo, o PT também resvalou para o exclusivismo eleitoral e as articulações de cúpula, relegando ao segundo plano, ou mesmo extirpando da sua dinâmica, o processo de organização e mobilização “nos locais de moradia, nos locais de trabalho e nos movimentos sociais”, conforme se ouvia nas rodas militantes nos anos 80 do século passado. Essa mudança de foco trouxe profundas repercussões na vida partidária, pois a feição organizativa de qualquer instituição é moldada pela sua prática cotidiana. Segundo o dito popular, “o hábito do cachimbo faz a boca torta”. E o PT entortou, sob os efeitos desse desvio político.

Houve um tempo em que os órgãos de direção partidários e as assembléias eram as instâncias em que se discutiam as articulações políticas maiores,  as estratégias eleitorais, as candidaturas etc. Era comum militantes fazerem referência a “o partido”. Com os primeiros parlamentares eleitos, uma nova instância de influência e poder surgiu e foi crescendo. E se passou a ouvir militantes se referirem a “o mandato”, com um evidente encolhimento da sua visão e da sua fidelidade política. Os gabinetes parlamentares passaram a agir com autonomia e a adquirir mais peso do que as direções partidárias. A chegada aos cargos executivos, com o seu maior poder de influência, de caneta e de caixa, desencadeou um processo avassalador de invasão de atribuições e sujeição das direções partidárias. Elas passaram a funcionar como correias de transmissão dos interesses de governo, e não como direções políticas, responsáveis pelo controle do desempenho dos seus militantes nas diversas frentes de atuação, incluindo-se aí os seus representantes no parlamento e no executivo. Como decorrência, escapou-lhes das mãos a coordenação dos processos sucessórios. No mais tradicional estilo do caciquismo, um prefeito, governador ou presidente, passou a se achar com o direito de indicar o seu sucessor e a coordenar a campanha eleitoral, como se a candidatura pertencesse a ele, e não ao partido e a um conjunto de forças partidárias e não partidárias.

À reboque dos executivos, as instâncias dirigentes passaram a ter como foco principal de atuação as eleições bienais da república e, nos intervalos, as eleições internas, cujos resultados determinam o controle dos diretórios, a indicação de candidaturas e o acesso a recursos financeiros, na sua maior parte utilizados em campanhas eleitorais e quase nada destinados ao fortalecimento da estrutura partidária e à qualificação da militância. Vejam-se a precariedade dos diretórios – e a inexistência dos diretórios zonais - , sem funcionamento regular, sem estrutura de comunicação, sem preparação de atas ou, ao menos, súmulas das reuniões.

Dentro desse padrão, com as direções partidárias destituídas das suas funções políticas maiores e restritas às mobilizações eleitorais, convenhamos que as coisas têm  andado razoavelmente, com o reforço do serviço de marketing e da militância paga. Mas o fato de a atuação dos militantes junto aos movimentos popular e sindical, suas lutas e mobilizações, não integrarem mais as pautas das reuniões, retira um elemento diferencial importante e nivela por baixo o PT, sob o denominador comum do eleitoralismo. Essa auto-satisfação com os jogos da política convencional enfraquece a formação de uma pressão democrático-popular independente e garantidora do alargamento e da velocidade dos processos políticos transformadores. E eleva o poder de barganha das forças mais atrasadas que integram alianças políticas e ocupam espaços governamentais.

Marcelo Mário de Melo é poeta e jornalista

Nenhum comentário:

Postar um comentário